sábado, 27 de novembro de 2010

Juqueriquerê: um rio de histórias

Não se trata de mais um rio de Caraguatatuba, com um volume maior de água e por isso com um grande trecho favorável à navegação de embarcações pesqueiras e de recreio. O Juqueriquerê é mais que isso

Quem passa pela ponte de estrutura curva por sobre o Rio Juqueriquerê, no bairro Porto Novo, pode achá-la bonita, interessante e curiosa do ponto de vista de obra de engenharia viária. Mas não sabe que, ao cruzar aquele rio silencioso, estará passando por sobre um marco magnífico de um passado cheio de glórias desta região.

Com efeito. O Rio Juqueriquerê foi o divisor dos domínios dos índios Guaianases e Tupinambás que por aqui viviam se enfrentando quando do início da colonização brasileira. Os domínios dos Tupinambás compreendiam da sua margem esquerda até o Espírito Santo. Os índios donos desta imensidão territorial mantinham uma espécie de “sede” na aldeia de Iperoig (Ubatuba).


Foi em Iperoig onde ocorreu a célebre Conferederação dos Tamoios: a reunião de várias tribos tupinambás para, em guerra, combater o português invasor e seus aliados e defender suas posses, desencadeando uma série de sangrentos conflitos de defesa e vingança por estas paragens. Este fato histórico é relatado pelo escritor Washington de Oliveira, o seu Filinho, antigo farmacêutico de Ubatuba, em seu livro Ubatuba – Documentário.

Só por esse fato seria de inteira justiça erigir às suas margens um monumento em homenagem ao índio Tupinambá. Mais exato seria reverenciar o índio Tamoio – que é o mesmo Tupinambá, mas preparado para a guerra e defendendo os seus domínios depois de se declaram os primeiros moradores desta região. O que não se concebe é que tão significativo marco de um passado glorioso passe despercebido a todos nós e permaneça no esquecimento, separando-nos de nossas origens e tradições e fazendo ouvidos moucos à nossa ascendência histórica.

O Juqueriquerê, bem depois desses acontecimentos, que remontam aos meados de 1600, também se tornou linha divisória, agora para separar os territórios das capitanias hereditárias de Santo Amaro e São Vicente. Não há dúvida de que o rio se prestou a tomar parte importante nessa nova página da história do Brasil, na reorganização do seu espaço político-geográfico. Entretanto, tal fato também é desconhecido da maioria da população da cidade e nenhuma referência oficial se faz a ele, a não ser poucas linhas por fim inseridas no site da prefeitura municipal e nada mais.

Com a criação dos municípios no país, o rio Juqueriquerê por um bom tempo foi indicado como a linha divisória entre os territórios de Caraguatatuba e São Sebastião. Até que, em 1964, através da Lei Estadual nº 8.092, de 28 de fevereiro, que reorganizou o quadro territorial e administrativo do Estado, a linha divisória foi estendida até o rio Perequê-Mirim, em desfavor de São Sebastião.

A região do Porto Novo até o bairro da Enseada, já no vizinho município, é plana e por isso muito importante para qualquer cidade ao sopé da Serra do Mar. São Sebastião, em especial, se ressente de áreas com essas características em seu território. Por isso que em fins da década de 90, a Câmara de Vereadores daquela cidade iniciou um movimento político com vista a fazer retornar a divisa entre os dois municípios à sua antiga demarcação, isto é, ao Rio Juqueriquerê.

O movimento dos vereadores, visto naturalmente com antipatia por Caraguatatuba, não passou de barulho disforme e sem eco, perdendo-se poucos meses depois na porosidade das próprias paredes frias da casa legislativa. Assim, mantida a divisa no Perequê-Mirim, desfez-se qualquer pretensão de alteração da divisa territorial entre as duas cidades co-irmãs.

O fato de Caraguatatuba ter suas demarcações alteradas ao longo do tempo faz surgirem algumas circunstâncias curiosas. É o caso, por exemplo, de pessoas que nasceram na margem direita do Rio Juqueriquerê antes de 1964. Foram registradas como sebastianenses, mas as que nasceram depois desse ano no mesmo local são consideradas caraguatatubenses. É um típico caso de “dupla cidadania aparente”. Isso aconteceu com Tiago Santana, vereador por algumas legislaturas em Caraguá e presidente da Câmara Municipal em 1991. Tiago jura que é caraguatatubense, mas a sua certidão de nascimento não confirma isso.

Tiago Santana tem dois motivos para se orgulhar: ser a um só tempo caraguatatubense e sebastianense. “Amo Caraguá e adoro São Sebastião. Mas está na hora de se fazer um comitê pró-emancipação do Porto Novo”, arrisca ele.

Outro cidadão de “dupla cidadania” é o senhor Ademir Paulino Ferreira, 61. Apesar de trazer na certidão que sua cidade de nascimento é São Sebastião, ele prefere dizer que é filho nato de Caraguatatuba. “Tenho orgulho de ser cidadão de Caraguá”, disse ele.


Postado por: Caraguablog, o Blog de Caraguá - k

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